Como peixes fora de água

2 de agosto de 2022

A arte de colocar e cortar pedras calcárias, de forma a criar uma alternância rítmica de desenhos e padrões ou dispostas sem uma ordem aparente no chão, é uma das imagens de marca do nosso país: a calçada portuguesa.

Os primeiros calceteiros conhecidos foram um grupo de presidiários de Lisboa, em 1842, e a primeira obra digna de distinção é o "Mar Largo", na Praça do Rossio, realizada na mesma década.

Rapidamente, as pedras da calçada foram "em busca de outros mundos", ou melhor, de novas ruas e praças, tanto em Portugal como no estrangeiro: os porões dos navios, que daqui zarpavam, estavam repletos de pedras calcárias porque o peso conferia estabilidade às embarcações durante a navegação.

Em Faro, em 1895, foi executada a primeira área calcetada onde hoje se encontra o Jardim Manuel Bívar. Seguiram-se intervenções de excelência na Rua de Santo António e na Rua D. Francisco Gomes. Os brasões da calçada do Largo do Carmo, da cidade de Faro e da Ordem do Carmo, representam um dos exemplos mais belos desta arte de "bordar" o chão, tanto pela invulgaridade das cores como pelo corte singular das pedras, em espiga, em escama, em quadrados e hexágonos, chegando a ser minúsculo nos detalhes do rosto da Nossa Senhora. 

As pedras utilizadas são oriundas das Serras de Aire e Candeeiros e da zona da Bordeira, na Freguesia de Santa Bárbara de Nexe e atualmente a calçada artística cobre uma superfície de 60000 m2 da cidade de Faro.

A calçada artística coexiste com a calçada funcional, tão antiga e tão pisada como a mais icónica das duas. Nas ruas do Bairro Ribeirinho há uma panóplia de estilos de calçada funcional que variam segundo a colocação das pedras: da calçada "à fiada", com as pedras alinhadas em filas paralelas, ao "malhete", tendencialmente formado por polígonos irregulares, até à calçada "ao quadrado", aplicada em diagonal e seguindo um alinhamento de 45 º com as paredes e lancis.

Todavia, marcar passo nesta que deveria ser a calçada funcional, nem sempre é tarefa fácil. 

A simples e natural deambulação pelas nossas ruas, por vezes, consegue-se tornar numa espécie de prova de corta-mato em câmara-lenta e, como se de um bizarro ritual de iniciação se tratasse, toda a gente que por aqui mora pode afirmar já ter caído ou tropeçado na calçada do Bairro Ribeirinho, pelo menos uma vez...

Andamos, pé ante pé, num equilíbrio precário, ora parecendo acrobatas de circo, ora desengonçados como peixes fora de água.

O piso é irregular, apresentando buracos e desníveis nos quais até os pés mais bem treinados e calçados conseguem tropeçar. 

Em poucos metros conseguimos ter a "colagem" de três pavimentos: os paralelepípedos da calçada, a brita das obras e o alcatrão mal aplicado...

Toda esta área "menos" nobre, mas tão vivida, pisada e visível por moradores, trabalhadores e visitantes, merece mais atenção.

Vários estudos evidenciaram a sustentabilidade da calçada portuguesa que, quando bem executada e corretamente mantida, além de qualificar o espaço público favorece e aumenta a permeabilidade dos solos, representando a melhor solução estética, funcional, ambiental, económica e patrimonial para a pavimentação das ruas.

Em 2021 a Calçada Portuguesa passou a estar inscrita no Inventário do Património Cultural Imaterial e o objetivo final será o de apresentar uma candidatura à Unesco a Património Cultural Imaterial da Humanidade, tal como aconteceu com o fado.

É fundamental que a Câmara Municipal de Faro valorize e defenda também a calçada portuguesa funcional que se encontra nos recantos deste bairro tão central e tão povoado por gente que "tem o rosto desenhado por paciência" (mas que não se resigna).

É importante que se zele pela conservação e renovação, pugnando pela correta execução, colocação e manutenção da calçada que é, sem dúvida, uma das mais belas formas de arte 100% portuguesa.

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